domingo, 25 de novembro de 2012

Monstros de Aço

Monstros de aço!
Porque assombram nossas cabeças com seus rugidos 
monótonos, ininterruptos e barulhentos?

Ameaçadores, 

Alazões alados,
só que  feios e desengonçados.

Arautos do privilégio 
dos que fogem do incômodo,
incomodando os já tão incomodados.

Por favor, não caiam sobre nós!

Antes, virem
borboletas.

quarta-feira, 21 de novembro de 2012

A Morte e o Silêncio

Certa vez escrevi uma frase sobre a necessidade de se calar em certas circunstâncias:

“Diante dos sentimentos mais profundos de outra pessoa, as palavras podem ser como oferecer um punhado de merda para uma princesa esplendorosa.”

Hoje, lendo um livro do Rubem Alves "Pimentas: para provocar um incêndio, não é preciso fogo", me deparei com um conto lindo e triste, chamado "A Dor da Morte", que me lembrou desta frase. Segue a transcrição dele, para que tenham as próprias impressões.

 46. A Dor da Morte
Nos breves intervalos em que a chuva parava de cair e os raios de sol se infiltravam pelas nuvens, o arco-íris aparecia levando os homens a se lembrar da promessa que Deus fizera depois do dilúvio: ele nunca mais permitiria que as águas destruíssem a vida. Mas parece que ele se esquecera. A chuva caía sem parar alagando campos, inundando cidades, derrubando casas, matando gente e bichos. 

Ele era um menino de 14 anos, feliz, que gostava de viver. Filho único, morava em Floripa. Como todos os meninos e meninas, ele deveria ir à escola naquele dia porque a chuva não estava tão forte assim. E andar na chuva é uma arte que dá alegria às crianças.
Chegou a hora do recreio, tempo livre para brincar. A chuva voltou mais forte, com raios e trovões. Havia um lugar abrigado da chuva, uma marquise, construída fazia três semanas. Era uma cobertura de cimento, planejada por engenheiros que sabiam o que estavam fazendo. Sólida. Ele se abrigou sob a marquise para ver a chuva. Mas a marquise, ignorando ferro e cimento, caiu sobre ele, esmagando-o. Agora, no seu lugar, resta uma dor que nenhuma palavra pode conter.

A morte faz calar as palavras. São inúteis. Servem para nada. Somente os tolos tentam consolar. Eles não sabem que as palavras de consolo, brotadas das mais puras intenções, são ofensas à dor da pessoa golpeada pela morte. Porque elas, as palavras de consolo, são ditas no pressuposto de que elas têm poder para diminuir o vazio que a morte deixou. Como se a pessoa que a morte levou  não fosse tão importante assim e algumas palavras pudessem diminuir a dor que sua morte deixou.

Mas não há palavra ou poema que possa com as únicas palavras que a morte deixa escritas:"nunca mais". Nada existe de mais definitivo e mais doloroso que esse "nunca mais...".
Bem fizeram os amigos de Jó que o visitaram com o intuito de consolá-lo na sua desgraça. O texto bíblico descreve o que aconteceu:

"Quando eles de longe o viram, eles não o reconheceram; e eles levantaram suas vozes e choraram. e eles se assentaram com ele no chão durante sete dias e sete noites, e nenhum dele lhe disse uma palavra sequer, porque viram que o seu sofrimento era muito grande" (Jó 2.13).

Todos os amigos querem diminuir o sofrimento da mãe. Cercam-na com palavras que, pensam eles, trarão algum consolo. Mas que palavra ou poema poderá substituir o seu filho? E a chamam ao telefone para dizer-lhe suas palavras doces e cheias das intenções mais puras. Mas a pureza das intenções não garante a sua sabedoria. E aí, à dor da morte do filho, acrescenta-se uma outra dor: a mãe é obrigada a ouvir os consoladores delicada e pacientemente, com sorrisos de agradecimento... Mas são tantos os consoladores e eles cansam tanto...

Gestos de consolo, lembro-me de um que me comoveu. Eu vivia em Nova York com minha família. Aí o pai da minha esposa foi morto num acidente, no Brasil. Ao abrir a porta do apartamento, no chão estava um buquê de flores. Aquele que o trouxera se retirara em silêncio. Não tocara a campainha. Mas deixara um bilhete onde estava escrito: "Não quis perturbar a sua dor..."

Rubem Alves